NOVAS OPÇÕES DE TRATAMENTO PARA A “VÁLVULA ESQUECIDA”

A válvula tricúspide foi, durante muito tempo, pouco considerada pelos cardiologistas e cirurgiões cardíacos. Achava-se, por várias razões, que o impacto clínico da doença tricúspide não seria muito relevante ou que a sua disfunção melhoraria após o tratamento de outras válvulas do coração.
Nada de mais errado: hoje sabemos que, apesar de se manifestar durante muito tempo com sintomas ligeiros (cansaço, inchaço dos pés e das pernas, falta de ar, por exemplo), a doença da válvula tricúspide pode levar a consequências dramáticas. Para além disso, quando os sintomas são mais exuberantes, as opções de tratamento são mais limitadas e menos eficazes. É assim fundamental um diagnóstico atempado e uma orientação adequada.
A tricúspide é a válvula maior do nosso coração. Situada na parte direita do coração, entre a aurícula e o ventrículo direitos, regula o sangue que vai na direção dos pulmões. A válvula tricúspide tem uma estrutura de suporte (o anel), muito fina e pouco resistente; tem normalmente 3 folhetos (mas podem ser mais) e uma série de cordas que a conectam ao ventrículo direito.
Na esmagadora maioria dos casos, a doença da válvula tricúspide é uma fuga ou regurgitação (a válvula não fecha bem), em consequência da dilatação do anel.
O tratamento farmacológico é útil no controlo dos sintomas de insuficiência cardíaca, mas não tem impacto na progressão da doença. A cirurgia, por sua vez, é raramente realizada na doença isolada da válvula tricúspide, sendo associada a resultados pouco animadores, particularmente numa fase mais avançada da doença.
O tratamento da doença tricúspide por cateterismo tem surgido há alguns anos como alternativa de baixo risco à cirurgia e está a crescer no contexto de uma patologia muito frequente e raramente tratada. A técnica mais usada é a de aproximação de folhetos (clip tricúspide), introduzida em Portugal em 2021 por uma equipa de cardiologistas do Hospital de VN de Gaia, liderada pelo Dr Bruno Melica. Neste procedimento, o objetivo é aumentar o contacto entre os folhetos da válvula com dispositivos que agarram a aproximam os seus elementos móveis. É um procedimento muito seguro e eficaz, que permite uma rápida recuperação e que tem demonstrado bom resultados quando realizado por equipas experientes.
Em Julho de 2023, a mesma equipa do Serviço de Cardiologia do Hospital de VN de Gaia realizou o primeiro caso em Portugal de uma nova intervenção, a anuloplastia da tricúspide por cateterismo com o sistema Cardioband ( figura 1) . O procedimento consiste na aplicação de uma banda de tecido bio-compatível que é fixada ao anel tricúspide com pequenos parafusos ( figura 2). No final do procedimento é aplicada uma tensão na estrutura, o que leva a uma contração da banda e a uma diminuição do tamanho do anel com consequente melhoria do encerramento da válvula. As vantagens deste tratamento são várias: é seguro, porque realizado após um estudo extensivo e guiado por várias técnicas de imagem. É eficaz, porque atua contra o mecanismo que provoca a doença, a dilatação do anel valvular. Além disso, permite de replicar uma técnica cirúrgica consolidada e, por último, deixa o espaço para um eventual novo tratamento da válvula em caso de necessidade.
Em conclusão, a doença da válvula tricúspide merece atenção e uma orientação adequada e atempada; as técnica de tratamento por cateterismo estão a evoluir rapidamente e podem representar uma opção de tratamento segura e eficaz, capaz de ir ao encontro das necessidades dos diferentes doentes.
Figura 1 – Cardioband
Figura 2 – Cardioband fixada ao anel tricúspide.